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19 de Abril de 2024

Morte do bebê em parto natural ensejou dura indenização contra Hospital

4a. Câmara Cível do TJ-GO determinou duríssima indenização contra hospital em favor de casal que perdeu bebê em parto natural.

Publicado por Tiago Falconiery
há 9 anos

Vamos a uma situação hipotética, a qual encontrará determinada correspondência com o mundo real. As informações estão resumidas. Não há muitos detalhes no momento, mesmo assim eles serão irrelevantes, pois o que valerá mesmo para a reflexão crítica aqui proposta é a jurisprudência.

A mulher está em trabalho de parto.

Ela e seu marido decidiram pelo parto natural, pois ambos estudaram muito acerca dos benefícios dele, da indústria da cesariana, e das recentes notícias acerca da ANS e suas regras restritivas para a cesariana, incentivando (praticamente obrigando) o parto natural em detrimento da cesariana.

Decididos, determinados, "empoderados", eles vão a um hospital (no caso, o Hospital e Maternidade Santa Bárbara). O médico (sabe-se lá se é cesarista, ou apenas simpatizante do parto humanizado) decidiu aguardar o parto normal porque a mãe recusou uma cesárea.

A tragédia aconteceu: o bebê morreu.

Perder um filho logo após ou durante o nascimento é, sem sombra de dúvida, uma tragédia, algo extremamente doloroso, um sentimento que talvez seja impossível expressar em palavras.

Não quero, porém, entrar no mérito da tragédia, apenas no aspecto jurídico e filosófico da questão.

Abalados, infelizes, inconsoláveis, "desempoderados", os pais resolvem processar o hospital. Resultado: o hospital se ferrou com força e pagou pela situação, ainda que tenha sido responsabilidade ou não exclusiva do médico, ainda que tenha havido responsabilidade dos pais em sua decisão.

Os autores (os pais) ganharam uma indenização por danos morais no valor total de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), mais uma pensão durante 65 anos, calculada da seguinte forma: 2/3 do salário mínimo durante 25 anos, depois disso 1/3 nos 40 anos seguintes. Se fosse pago à vista, o valor atual seria de R$ 333.680,00 (trezentos e trinta e três mil, seiscentos e oitenta reais).

Reitero que tenho convicção de que não há dinheiro que pague a morte de um filho amado.

Porém, nos aspectos jurídico e filosófico, a decisão da sentença e do acórdão é passível de severas críticas. Deixo o detalhamento técnico dessas críticas para outros autores.

Aponto, finalmente, questões, conflitos e contradições, caso essa decisão seja mantida no STJ.

1) A indústria da cesariana persistirá, porém a burocracia aumentará;

2) Equipes de parto humanizado (médicos, enfermeiras, obstetrizes) aumentarão seus honorários, dados os altíssimos riscos jurídicos em caso de tragédia.

3) Pais "empoderados" continuarão sem voz nos hospitais. Continuarão sendo "vítimas" da violência obstétrica. Agora, com aval da justiça.

Se o STJ mantiver inalterada a sentença e a indenização (ainda que reduza os valores arbitrados), nenhum hospital particular tolerará pais "empoderados", que querem ditar as "regras" do seu parto. Serão calados, nem que seja pelo constrangimento ou pela força, e obedecerão rigorosamente as decisões de médicos. Estes, por sua vez, não terão independência de decidir conforme suas convicções e conhecimentos, mas serão mais dependentes e obedientes à política do hospital, que será mais rigorosa.

Eis algumas críticas objetivas à decisão, que considero absurda:

A) Indenização por lucro cessante para a morte de um bebê, como se uma criança de até 14 anos pudesse ser arrimo de família;

B) Hospital que responde não pelos seus serviços oferecidos, pela sua equipe contratada, mas por um médico que lá presta serviços autônomos, com liberdade de atuação;

C) O médico não foi incluído na sentença, não participou da condenação;

D) Os pais, ao comprovadamente recusarem a cesárea, contra a indicação do médico, aceitaram e assumiram os riscos dali recorrentes. Queriam eles ser violados em sua decisão e obrigados a fazer um procedimento que não queriam?

C) Milhares de pessoas morrem anualmente por conta da deficiência no atendimento do serviço público de saúde, pronto-atendimentos, nos hospitais da rede pública, por falta de vagas para cirurgias, de leitos, de disponibilidade de exames. Todas as famílias serão indenizadas pelo Estado por danos morais e por lucros cessantes?

O acórdão pode ser lido no seguinte link:

http://s.conjur.com.br/dl/maternidade-santa-barbara.pdf


Origem da notícia:

http://www.conjur.com.br/2015-jan-28/hospital-responde-erro-medico-durante-parto

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Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/morte-do-bebe-em-parto-natural-ensejou-dura-indenizacao-contra-hospital/163538383

2 Comentários

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Muito bom o texto Tiago, é o que os interessados pelo tema em sua maioria gostariam de dizer e você expressou sabiamente com palavras. Obrigada! continuar lendo

O acórdão pode ser lido no seguinte link:
http://s.conjur.com.br/dl/maternidade-santa-barbara.pdf

Uma das críticas técnicas à decisão é a interpretação do "trabalho infantil" como forma de pagamento da pensão. continuar lendo